Maurício Savarese, especial de Pequim para o Comunique-se
Os correspondentes em Pequim dos mais importantes jornais brasileiros avaliam que a realização dos Jogos Olímpicos pela China pouco vai alterar a postura rígida do governo para com a mídia estrangeira em curto prazo, depois de dezenas de casos reportados sobre interferência estatal na cobertura jornalística durante o período do evento.
Para eles, apesar de uma relativa abertura à imprensa internacional ao longo das últimas semanas, a China manteve a grande maioria das limitações ao trabalho jornalístico sem que a organização do evento esportivo mais importante do mundo sofresse grande prejuízo.
"No curto prazo não vai mudar nada. Até porque os jornalistas que vieram tiveram basicamente os problemas de qualquer grande cobertura. No que interessa, na China real, as Olimpíadas mudaram pouco, com algum acesso a mais a sites antes proibidos. Mas o resto ficou do mesmo jeito", disse o jornalista Gilberto Scofield Jr, correspondente do diário O Globo na capital chinesa.
"Quem esteve no espaço olímpico apenas viu uma ilha da fantasia. A China real estava aqui fora e muita gente da imprensa não viu. O governo pode acabar achando que no fim das contas valeu a pena continuar as coisas como sempre fazem. Se forem mudar alguma coisa em favor de mais liberdade de imprensa, vai demorar", afirmou ele, que vive no país há quatro anos.
Em sua segunda passagem pela China, a jornalista Cláudia Trevisan, correspondente do diário O Estado de S.Paulo, avalia que a China pode fazer um movimento parecido com o da cobertura do terremoto em Sichuan, em maio deste ano, no qual morreram quase 90 mil pessoas, segundo dados extra-oficiais.
"Primeiro tivemos um momento de mais liberdade, no qual o Partido Comunista queria mostrar que estava dando uma resposta rápida ao desastre. Depois, quando fomos buscar as histórias das escolas mal construídas que desabaram e mataram centenas de crianças, começamos a enfrentar problemas. Eles fazem esses movimentos de abertura e fechamento com alguma freqüência", afirma.
Para ela, o sucesso dos Jogos no país ajuda a legitimar o regime comunista e pode tornar ainda mais demorado um processo de maior abertura da China para a mídia estrangeira.
"Eles muitas vezes invocam a história milenar do país para justificar o tempo com que algumas decisões são tomadas. Eles levaram tempo para que os jornalistas estrangeiros tivessem um pouco mais de possibilidade de entrevistar pessoas do campo, por exemplo. Antes era só com autorização expressa. Talvez as Olimpíadas façam com que isso se mantenha, mas ainda é difícil saber como o governo, mais popular do que nunca, vai lidar com isso."
Para o correspondente da Folha de S.Paulo em Pequim, Raul Juste Lores, a cobertura dos Jogos foi positiva para a China, apesar das reportagens mais negativas para o país na mídia ocidental. E exatamente por isso, o país comunista pode manter restrições como intimidação de fontes e destruição de material jornalístico e tolerar a violência de paramilitares contra repórteres que estejam em alguma cobertura que contrarie os interesses do Politburo.
"Das duas uma: ou eles vão pensar que a mídia internacional não morde, que pode vir aqui e não incomodar tanto, ou eles resolvem manter exatamente como está, já que puderam realizar um evento internacional sem terem de mudar muita coisa no trato", disse ele, que está na capital chinesa desde o início do ano.
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