quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Notas de fim de ano

1 - Choveu pacas no Brasil inteiro. E São Paulo teve sua parcela pluviométrica. Mas em nenhum telejornal de segunda-feira havia a seguinte frase: "A Prefeitura informou que..." Apenas na quarta-feira li na Folha de S.Paulo três parágrafos dizendo que a administração de Gilberto Kassab nada tinha a declarar sobre o alagamento de vários pontos da cidade que já são problemáticos há anos. Tampouco alguém informou se Kassab se encontra na capital paulista. Como não sou petista, tentei não lembrar de que quando algo parecido aconteceu na gestão de Marta Suplicy, havia nos jornais fotos dela em Paris, com cara de quem estava passando férias durante os dias de uma reunião de um grupo de cidades importantes. Tentei não lembrar, mas não consegui.

2 - Assisti a um programa do SporTV que relembrou o fatídico título do Palmeiras no Paulistão de 1993. O atacante Evair com uma pose esquisita para quem era tido como um jogador de Cristo, modesto e equilibrado. Disse ele ao longo do programa inteiro que estava claro que o time dele seria campeão "desde a entrada em campo", apesar de ter de reverter uma desvantagem de 1x0 no tempo normal. O SporTV foi competente ao lembrar que antes de o Alviverde abrir o marcador, Edmundo merecia ser expulso por uma entrada criminosa em Paulo Sérgio. Nem amarelo ele levou. E que o zagueiro Antônio Carlos, amigo de Vanderlei Luxemburgo e diretor de Corinthians, também devia ter ganhado cartão vermelho por uma cotovelada sem bola que deu em Neto. Pena que o árbitro era José Aparecido de Oliveira, o Byron Moreno brasileiro.

3 - Já deu no saco ler sobre Ronaldo, "contratações mais sensacionais da história" feitas pelo São Paulo e sobre os reforços incríveis que devem levar os times cariocas a absolutamente lugar nenhum. Será que não tem um mínimo de seriedade nos jornais esportivos de fim de ano? Ou eles precisam da flexibilidade moral para tratar desses temas para sobreviverem ao ano seguinte?

4 - Dilma e Serra não usam mais óculos. Agora vai.

domingo, 14 de dezembro de 2008

Ronaldo é pai


Passado o frenesi da chegada do gordinho ao Corinthians, ainda me espanta o fato de pouca gente ter destacado a importância de o rapaz ter assinado com o clube paulista muito por causa do seu filho Ronaldo, torcedor do Alvinegro.

O fenômeno de marketing pode ser flamenguista, ser doido por dinheiro e gostar do Rio de Janeiro, mas deve saber que o clube mais importante do Brasil é, sim, o do Parque São Jorge (não é o mais campeão nem o mais rico, mas só pelos sentimentos que desperta, contra e a favor, não há outro no mesmo nível).

Para o público internacional, talvez uma mudança para o Flamengo tivesse sido melhor, visto que, como conta o professor Maurício Stycer no seu blog, a maioria dos correspondentes estrangeiros, sabe-se lá o motivo exato, vive no Rio de Janeiro: mais de 100 em cerca de 150.

A grana iria aonde ele fosse, ainda que se tratasse da Portuguesa, que está longe de ter a torcida que o Corinthians tem apenas no bairro do Tatuapé, por exemplo. A opção pelo Parque São Jorge é também para satisfazer ao filho, ouvi de gente que o conhece bem na semana passada no Rio de Janeiro.

Tem gente que acha que tudo que acontece se deve única e exclusivamente à grana e ao marketing e se esquece que algumas vezes as coisas mais singelas podem estar por trás de grandes movimentos econômicos. Perderam o encanto.

E apesar de não ter gostado da idéia a princípio, aprovo a comoção que tomou conta dos torcedores em seguida. Ronaldo, que tem uma das mais belas histórias de superação no futebol mundial, pode até não ser um sucesso esportivo quando jogar. Mas só pelo encanto que trouxe para os menos azedos, já valeu a pena.

domingo, 7 de dezembro de 2008

O sofrimento dos outros

A internet é uma ferramenta sensacional. Mas ela torna as pessoas muito mais frias com o sentimento alheio. E isso é particularmente verdadeiro quando se trata de futebol. Na rede mundial, ter respeito pelos adversários é quase "coisa de viado", como já li um torcedor comentar no Orkut. Neste domingo de dúvidas sobre se ainda vamos chamar o campeonato brasileiro deste ano de Madonnão 2008, os vascaínos me deram a certeza de que ainda que haja dignidade no fracasso, o povo dos nossos tempos converte o sangue, o suor e as lágrimas dos rivais num riso cínico, insensível e escroto.

Um riso que vai muito além do tom de galhofa.



Não sou vascaíno. Sou antipático a Eurico Miranda. Não sou fã de Edmundo. Mas como não se comover com Pedrinho, vascaíno desde pequeno e que via seu clube do coração ser rebaixado? Como o encolhimento de um adversário histórico pode aumentar o tamanho de quem comemora o seu rebaixamento?

Nos minutos finais da derrota para o Vitória, os vascaínos cantaram o hino do clube. Sinal de grande dignidade. Um tipo de dignidade que só a derrota ensina. Um tipo de dignidade que passa longe de quem se diz vencedor às custas apenas do sofrimento dos outros.

sábado, 6 de dezembro de 2008

O drama de sifu

O presidente da República usou em público um termo cujo significado é "se fodeu". É quase tão inapropriado quanto ouvir Hugo Chávez dizer "Alca al carajo!", numa cúpula anti-tudo na Argentina. Mas acho sempre que as pessoas têm direito de dizerem o que quiserem. Inclusive o representante máximo de um país. Depois ele responde por aquilo que disse e fim de papo.

No caso de Lula, são apenas palavras ao vento.

Acontece que em alguns casos o que as pessoas dizem traz consequências. O que dizia há alguns meses esse mesmo mercado com diarréia ao qual o presidente se referiu no discurso do sifu? Não por acaso me lembrei de um gerente do banco onde tenho conta.

Ele é um yuppie convicto, com aspecto higiênico e olhos azuis, cabelos loiros, do tipo que os mais bestalhões confiam no primeiro segundo. Nem é pela simpatia: é pelo ar sério de quem sabe o que vai fazer com o seu dinheiro. Esse aspecto é tão convincente que neste momento ele nem é mais gerente pessoal: quando liguei para perguntar sobre os investimentos, me alertou que foi promovido e agora trabalha na sede do banco em São Paulo.

Pois bem.

Há um ano eu resolvi investir em um fundo de renda fixa cuja rentabilidade varia de acordo com ações da Bovespa. Era junho de 2007. Esse rapaz, com um nome grego bem esquisito, disse que eu tinha três opções: conservadora, intermediária e agressiva (a qual também poderia ser chamada de sifu hoje em dia).

Pedi a ele que traçasse um panorama sobre as finanças globais para que eu fizesse o investimento. Ele pintou um cenário róseo, como se eu pudesse fazer uma besteira colocando meu dinheiro no fundo mais conservador. Falou de mil vantagens, de como a Bovespa podia superar os 70 mil pontos (hoje são 40 mil) e disse que os menos otimistas optam pelo fundo intermediário.

Foi isso que eu fiz. E há três meses recebi uma cartinha dizendo que a porcentagem de retorno que eu teria com o fundo tinha passado por um "abalo". Interrompi o investimento. Ainda bem. Mas as palavras do yuppie que provavelmente ganha dez vezes mais do que eu machucaram o meu bolso. Poderia ter sido ainda pior se eu tivesse acreditado integralmente no que ele me disse.

E é aí que eu lamento: enquanto encheram o meu saco com o sifu do presidente, o meu dinheiro sifu no banco. Quantos outros não terão se dado ainda pior daqui alguns meses? E vão sifu não por uma questão de etiqueta. Vão sifu por picaretagem e incompetência do mercado diarréico. Um mercado que deveria assumir também nas palavras a sua porção da bosta geral que criou.