terça-feira, 30 de setembro de 2008

A crise explicada

Está no blog do colega Fernando Canzian, é de autoria desconhecida, mas não tem como não ler isto para entender a crise nos Estados Unidos, talvez a maior que já existiu no mercado financeiro.

Vamos lá:

"O seu Biu tem um bar, na Vila Carrapato, e decide que vai vender cachaça 'na caderneta' aos seus leais fregueses, todos bêbados, quase todos desempregados.

Porque decide vender a crédito, ele pode aumentar um pouquinho o preço da dose da branquinha (a diferença é o sobrepreço que os pinguços pagam pelo crédito).

O gerente do banco do seu Biu, um ousado administrador formado em curso de 'emibiêi', decide que as cadernetas das dívidas do bar constituem, afinal, um ativo recebível, e começa a adiantar dinheiro ao estabelecimento tendo o pindura dos pinguços como garantia.

Uns seis 'zécutivos' de bancos, mais adiante, lastreiam os tais recebíveis do banco, e os transformam em CDB, CDO, CCD, UTI, OVNI, SOS ou qualquer outro acrônimo financeiro que ninguém sabe exatamente o que quer dizer.

Esses adicionais instrumentos financeiros alavancam o mercado de capitais e conduzem a operações estruturadas de derivativos na BM&F, cujo lastro inicial todo mundo desconhece (as tais cadernetas do seu Biu).

Esses derivativos estão sendo negociados como se fossem títulos sérios, com fortes garantias reais, nos mercados de 73 países.

Até que alguém descobre que os bebuns da Vila Carrapato não têm dinheiro para pagar as contas, e o Bar do seu Biu vai à falência. E toda a cadeia desmorona."

Fica aí a indicação.

sábado, 27 de setembro de 2008

Experiência

Piedosos leitores, operadoradetelemarketingmente vou estar testando o sistema de blogs da Abril pelas próximas semanas, a convite da editora. Por algumas semanas, publicarei os mesmos textos cá e lá, no endereço http://blogs.abril.com.br/blogdosavarese.

Durante a minha estada em Pequim, conversei por email com um diretor da editora --assim como aconteceu com muitos outros blogueiros-- me sugerindo que fizesse a mudança em troca da possibilidade de participar de cursos e de promoções.

Ouvi amigos nas últimas semanas com argumentos favoráveis e contrários a essa iniciativa, que causou polêmica entre muitos blogueiros, uma vez que a editora pode usar nossos posts para dar chamadas na capa do seu site sem pagar um centavo aos autores.

Outros falaram na maior repercussão no site da editora, que parece determinada a ser mais atenta com produtos de Internet. Depois de pesar tudo, resolvi experimentar o sistema da Abril e se dentro de algum tempo ele parecer melhor, farei a mudança em definitivo.

Se vocês tiverem opinião sobre o assunto, peço que me deixem nos comentários ou se manifestem por email. Aqueles que puderem contribuir, agradeço de coração. Aqueles que não puderem contribuir, agradeço da mesma maneira e desejo a todos uma boa viagem e quenossosenhorJesusCristo esteja com vocês.

Clima por Kassab

Há alguns meses eu dava por certa a eleição do tucano Geraldo Alckmin como prefeito de São Paulo. Pelo visto ele não vai nem para o segundo turno. E possivelmente ainda pegue o caminho da rua do PSDB e se filie a uma sigla lulista, como o PSB. Quem sabe ainda opte por uma sigla de oposição menos tucana, como o PPS. Mas o fato é que a perspectiva do ex-governador está sendo frustrada pelo atual prefeito, Gilberto Kassab, que conta com amplo apoio da mídia e, é claro, da máquina municipal para se manter no cargo.

Um bom termômetro para mensurar o clima pró-Kassab é a Folha de S.Paulo, que tem publicado as matérias menos favoráveis ao prefeito no caderno da cidade, não no de política, onde sobram pancadas para Alckmin e para a petista Marta Suplicy. Não poderia ser diferente dada a pública amizade dos donos do jornal com o governador José Serra, que age nos bastidores em favor de Kassab.

A prática é legítima. O jornal vende seu produto e as pessoas compram se quiserem. E por ser empresa privada, tem o direito de apoiar quem bem entender. Seria melhor se o fizesse.

O problema é quando esse apoio se torna intelectualmente desonesto. Matéria publicada no site UOL, de propriedade da Folha, diz que a petista, líder nas pesquisas de intenção de voto, já é superada por Alckmin e por Kassab no segundo turno das eleições. No site, o título da referida reportagem é "Pela primeira vez, Marta é ultrapassada por Alckmin e por Kassab no 2º turno".

Diz a reportagem que, de acordo com dados do Datafolha, "Alckmin tem a maior vantagem sobre Marta em um eventual segundo turno. Ele venceria por 48% a 45%. Já Kassab está um ponto a frente, com 47% a 46%". No país de onde eu venho, as pessoas falavam sobre margem de erro, que nessa sondagem fica nos dois pontos percentuais para mais ou para menos. Mas para o UOL, do grupo Folha, isso permite uma matéria mesmo em uma campanha acirrada como é a corrida pela prefeitura de São Paulo.

Nas poucas semanas em que cobri a eleição paulistana, cansei de ouvir no trabalho a respeito da necessidade de se tomar cuidado com a linguagem na hora de falar sobre pesquisas eleitorais. E de tentar ser equilibrado, uma vez que, no fim das contas, as diferenças entre os três são bem poucas --a diferença recai apenas em quem é o chefe do grupo que vai aparelhar a prefeitura nos próximos quatro anos. No fundo, é o que importa.

Por isso fico um tanto enfadado com quem tenta criar um clima anti-petista, como se a sigla fosse o mal maior a ser evitado. Nunca fui petista, estou à esquerda do PT e não consigo não achar um tanto ingênuo o excesso de crítica com a ex-prefeita, Clima que agora se estende a Alckmin, unicamente porque o personalista governador de São Paulo quer um aliado mais próximo na Prefeitura.

Esse é o tipo de aproximação que ajuda a inventar divisões onde elas não existem de verdade. E que hoje, por meio da mídia, despolitiza a campanha em relação aos temas que poderiam importar e trabalha em favor de Kassab e Serra. E de ninguém mais.

Tem gente que pode dizer que eu não estou acompanhando a eleição paulistana há tanto tempo, porque só comecei a segui-la de perto há algumas semanas. É verdade. Mas pelo menos no caso da conjuntura paulistana, ainda posso me valer de um velho bordão, porém pertinente, para me sentir livre para falar a respeito dela.

Não é preciso entrar no chiqueiro para saber que os porcos fedem.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Alckmin, Serra e o fim do PSDB

Eu tenho certeza de três coisas nesta vida: 1 - sou heterossexual, 2 - sou corintiano e 3 - vou escrever um livro sobre o fim do PSDB. E quando o texto estiver pronto, ainda não sei em que ano, ele será dominado por duas figuras: Geraldo Alckmin e José Serra.

São eses dois que há mais de 15 anos militam por duas correntes bem distintas do mais paulista dos partidos brasileiros. E são eles que darão fim à sigla para que surja alguma outra coisa que não faço idéia do que pode ser. Ainda que o nome fique, estará longe do que planejavam os seus pioneiros.

Serra é o homem do establishment. Intelectual, ideologicamente híbrido, egocêntrico, centralizador e cacique tucano desde que ajudou a fundar a legenda, por conta de supostas diferenças inconciliáveis com o PMDB de Orestes Quércia.

Fundador assim como Alckmin, não muito intelectual, conservador, um tanto mais capaz de delegar tarefas e pertencente ao baixo clero tucano, daqueles que foram praticamente aceitos sem que se esperasse muito deles em troca. Um homem das bases.

Neles dois, estão os modelos de partido que fazem o PSDB se debater há anos: apelar aos caciques e sem captar o senso das ruas ou buscar as bases e apontar representantes que não tenham o mesmo brilho? Os tucanos, coitados, ainda não sabem.

Assim como o ex-presidente José Sarney, Serra gosta de ser ungido. É assim desde quando promoveu conchavos que o levariam da Juventude Estudantil Católica à presidência da União Nacional dos Estudantes (UNE) em plena década de 1960 e, dali, ao exílio.

Somente décadas depois, pouco antes de ser alçado pelo padrinho FHC ao Ministério da Saúde, onde ganhou visibilidade e o direito de disputar a sucessão do grande amigo como candidato do governo, é que Serra percebeu que nem todos queriam ungi-lo.

E o artífice dessa situação se chama Geraldo Alckmin, ariete-mor de Mario Covas, grande rival interno do atual governador paulista desde a militância de ambos no MDB.

Engenheiro, santista e muito turrão, Covas não engolia Serra, professor de economia, palmeirense e muito turrão.

Foi por isso que em 1991, o deputado federal Alckmin teve apoio de Covas para destronar o candidato de Serra e do establishment tucano da presidência estadual da legenda.

O prêmio do falecido governador foi disputar o Palácio dos Bandeirantes e se alinhar para concorrer mais uma vez à Presidência. Alckmin ganhou o cargo de vice-governador e um inimigo poderoso. Serra conquistou uma vaga no Senado.

E quando concorreu à Prefeitura de São Paulo pela primeira vez, em 1996, não recebeu a mínima ajuda de Covas nem de Alckmin. Perdeu para Celso Pitta, candidato do então prefeito Paulo Maluf, tão popular que naquela época elegeria para sucedê-lo até a um hidrante de peruca --o que o tempo se encarregou de demonstrar.

A idéia de Covas era esperar a conclusão dos mandatos de Fernando Henrique Cardoso, eleito e reeleito pelo sucesso do Plano Real, e voltar a disputar com Serra. Desta vez, para concorrer à Presidência em 2002. Mas a morte chegou antes para o governador e abriu o caminho para o popular ministro da Saúde.

Serra foi ungido --apesar de defecções claras, como a de Tasso Jereissatti, defensor de Ciro Gomes. Covas, talvez, também desertaria. E Alckmin, tentando a reeleição como governador, parece não ter se empenhado pelo candidato tucano à Presidência.

Lula vence de lavada.

Inclusive em São Paulo, estado governado por Covas-Alckmin.

Em 2006, a divisão chega ao seu auge, com Serra querendo ser ungido e Alckmin ciente de que tem a base do partido com ele. E o então governador levou a melhor. Agora, em 2008, Alckmin tenta se eleger prefeito contra um candidato que era vice de Serra há quatro anos e que conta com vários tucanos no gabinete.

Serra sabe que não pode perder vexatoriamente uma eleição na capital do estado que governa. E Alckmin sabe que sua sobrevivência política depende de ir pelo menos ao segundo turno em São Paulo e destronar os serristas da máquina municipal.

Serra e Alckmin sabem que, depois da divisão na única eleição municipal que realmente importa no Brasil, o PSDB entrará em 2009 menor do que começou este ano. Se bobear, Alckmin já botou na conta do papa inclusive a sua saída do partido. E Serra sabe que isso o enfraquece para a disputa à Presidência em 2010.

O governador mineiro, Aécio Neves, sorri e espera na esquina.

Pelo visto é melhor eu já ir adiantando o livro.

P.S.> A referência ao hidrante de peruca é atribuída ao amigo Fernando Vives, o probo.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Como é sem graça a Segundona

Sinceramente não consigo comemorar nenhum gol do Corinthians na Série B como se fosse realmente importante. Nada feito pela equipe do empresário Carlos Leite e do treinador Mano Menezes me empolga. Este ano de 2008 serviu apenas para o corintiano ver que o clube é capaz de reagir --chegar à final da Copa do Brasil meses depois de ser rebaixado não é pouca coisa-- e para aprovar o estatuto que prevê eleições diretas no ano que vem.

Mas a tal dificuldade da Série B passou bem longe. E não é só porque o Corinthians montou um time mais ou menos, que chegaria tranquilamente à Sul-americana se estivesse na elite do futebol brasileiro. É também porque o nível do campeonato é muito, muito ruim. Não há um adversário sequer que enfrente o alvinegro pensando na vitória. Nenhumzinho. É todo mundo fechado atrás, esperando a sorte de um contra-golpe. E nada mais.

Para os rivais paulistas, não ter o Corinthians na elite é tão ruim quanto é para os corintianos. Nenhum outro clube desperta tanto amor e tanto ódio por estas bandas e mesmo que Palmeiras e São Paulo já se estranhem há algum tempo, o que gera mais tensão quando os dois se pegam, não há como negar que a grandeza do alviverde e do tricolor também depende de enfrentar o time do povo.

A não ser que o Palmeiras seja campeão brasileiro, o São Paulo se classifique epicamente para a Copa Libertadores ou o Santos seja rebaixado, esta temporada terá sido também um grande desperdício de tempo para os adversários corintianos.

Que assim seja!

Até porque para mim o ano futeboleiro já acabou há meses, na Ilha do Retiro. A companhia de palmeirenses, são-paulinos e santistas na avaliação de um ano bastante inútil será muito bem-vinda.

Vem logo, 2009!

sábado, 13 de setembro de 2008

Pequenices que não ia contar no blog

Achei que os caros leitores me tomariam por maluco ou mentiroso se contasse esses pequenos causos de viagem. Antes pensei em não citá-los. Mas como estou em casa neste sábado à noite, vamos lá.

1 - Meu celular chinês desapareceu um dia em Pequim e logo pensei em lamentar um eventual roubo para as autoridades locais. Dizem que é comum por lá afanarem celulares e bicicletas. Pois no fim do mesmo dia um hotel telefona para um amigo e informa que estão com o aparelho. E não tinha sido gasto nenhum centavo do crédito de aproximadamente 30 reais. Ainda ganhei um bolinho de chocolate durante a espera para receber o celular de volta.

2 - Jornalistas de veículos do governo chinês garantem que têm de lidar com uma cláusula contratual segundo a qual ganham menos a cada vez em que saem da redação para fazer alguma reportagem. O que será que Karl Marx acharia dessa liberdade de imprensa?

3 - Estava eu já em Paris à beira de um riacho na zona norte da cidade quando aparece um senegalês completamente bêbado. No meu francês escargótico, começamos a conversar sobre a situação dos imigrantes na França e sobre o Brasil. Ele diz que seu nome tem relação com estas bandas --mesmo sem saber exatamente do que se trata. O negão, com cabelo black power, se chama Samba.

4 - Metrô parisiense, horas antes de voltar ao Brasil. Estou perto da porta de saída do veículo quando entra um casal de brasileiros. Eles me contam que moravam em São Paulo. Assim como eu, moravam no bairro do Ipiranga. Assim como eu, moravam na rua Arcipreste Andrade. Assim como eu, moravam em uma vila. Assustados, paramos de perguntar mais detalhes e logo eu desci do trem.

5 - Os músicos do Pato Fu viajaram no mesmo avião que eu para São Paulo. E, até onde vi, absolutamente ninguém os reconheceu.

O mundo realmente dá muitas voltas.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

História de um repórter acidental em Pequim

Estudei em escola pública de periferia toda a minha vida. Minha mãe, filha de um matador de aluguel da região Centro-Oeste, foi faxineira, manicure e corretora de imóveis. Hoje ajuda a administrar uma loja no centro de São Paulo.

Meus amigos de infância têm profissões como mecânico, cobrador de ônibus e um, que se deu bem, virou agente de viagens. Outro ainda está patinando, passou alguns anos preso. Há quatro anos apenas eu e um colega não tínhamos celular numa turma de 45 pessoas na faculdade. Fiz minha primeira viagem de avião em 2006, aos 25 anos, dez anos depois de ir pela primeira vez ao cinema, a bordo de uma Brasília azul piscina bem arrebentada.

Você que chegou até aqui deve estar com a mesma dúvida que eu: como diabos consegui cobrir os Jogos Olímpicos de Pequim?

Também não sei direito, mas vou tentar explicar.

Escolhi a carreira de jornalista aos 10 anos de idade, após ver um tio repórter policial sair de casa de madrugada e voltar só no fim da tarde, cheio de causos. Era aquilo que eu queria fazer. E já naquela época eu queria mesmo é ter histórias sobre os Jogos Olímpicos –resultado de várias aulas perdidas para assistir na TV aos Jogos de Barcelona, em 1992.

Quem conta com poucos recursos se esforça para ser mais objetivo na vida. Por isso meus familiares logo recomendaram que eu estudasse inglês para um dia lecionar e pagar para conquistar o diploma de jornalista. E assim aconteceu. Em 2002, fui aprovado na Faculdade Cásper Líbero. Já no primeiro ano, novos amigos brincavam com o objetivo comum de cobrir os Jogos de Pequim. Eu achava bastante improvável. E assim pensei até o fim de 2007.

Um dos meus bons amigos foi chamado a trabalhar na rádio estatal chinesa. Quando ele me convidou para ir à China durante o período olímpico, aceitei sem titubear. Reservei a maior parte das economias feitas em dois anos e empenhei. Não me importei em manter o meu emprego, nem com o gasto levemente acima das minhas capacidades. Fazer jornalismo em um lugar tão cheio de complexidades me parecia mais valioso e recompensador.

E certamente foi.

Paguei pela passagem, providenciei a estadia com meu amigo, tirei minhas folgas acumuladas e férias e ganhei a autorização do chefe de onde trabalho para fazer freelances. Uma arquitetura nada fácil e que, com justiça, foi cercada de desconfiança. Ainda mais porque iria a Pequim sem uma única credencial –que também serve de visto de permanência no país.

Por conta disso, não houve escolha: já que a ditadura chinesa endureceu a concessão de vistos de jornalista, tirei visto de turista. Foi um mês e meio com constante medo de ser vigiado, espionado, seguido e, quem sabe?, deportado por estar cumprindo o dever moral de reportar tudo que pudesse sobre um lugar onde o governo ainda não tolera qualquer crítica vinda da imprensa. E fazer isso sem prejudicar os amigos que vivem aqui.

Até por minha segurança, poucas vezes me identifiquei como jornalista em Pequim. Quando a polícia veio me levar para passear –estava com o visto expirado--, afirmei ser professor e tradutor. Não deixa de ser verdade. Mas só pude ficar mais à vontade a respeito da minha profissão quando conversava com estrangeiros, nunca com chineses. Nas vezes em que precisei conversar com locais, fiz uso de intermediários: colegas que falavam o idioma ou que contassem com a credencial. Nenhuma vez usei os nomes verdadeiros dos entrevistados –nunca se sabe o que pode acontecer com eles, me recomendaram jornalistas que trabalham aqui.

Depois de trabalhar diante dessas dificuldades –sem falar na impossibilidade da comunicação no idioma local, o que é uma barreira enorme--, saio da China com a sensação de trabalho feito, mas de dever não cumprido. Por mais que cobrir as Olimpíadas seja um sonho realizado, principalmente para alguém com um histórico como o meu, muitas histórias se perderam neste momento em que a China esteve mais aberta do que nunca.

Não consegui contar nenhuma história de mecânico, de cobrador de ônibus e, até dos que se deram bem, como os agentes de viagem, iguais aos meus amigos de infância. É também para contar histórias como as deles que quis me tornar jornalista.

Saio da China tendo escrito 24 reportagens ao todo, para quatro veículos diferentes, sem falar nos inúmeros textos para este blog. Mas nada que contasse quem são as pessoas daqui e por que elas vivem desse jeito. O pior é que sinceramente não sei se teria sido melhor ter coberto o evento com um crachá no pescoço, perdido na Ilha da Fantasia do Olympic Green.

O que me alivia é o fato de que eu realmente tentei. Quase que por militância, vim até a China porque gosto de fazer jornalismo. Algumas pessoas que vivem aqui até agora não entendem o motivo de eu ficar tão irritado por estas bandas. E a razão é que eu quero continuar fazendo reportagem, pelo resto da vida se possível.

E hoje, dia em que finalmente pego meu vôo para deixar esta maluquice de China, deixo aqui o agradecimento às pessoas que viabilizaram essa minha aventura.

Ao amigo Felipe Corazza, pelo convite e por me abrigar em sua casa apesar dos óbvios riscos, e à sua noiva, Ana Torres, por me receber.

Ao amigo Victor Boyadjian, pois sem ele não teria trabalhado nem aproveitado a experiência tanto quanto aproveitei.

À minha família, minha namorada e meus amigos, já que sem o apoio deles não teria nem pensado em vir.

Ao Paulinho, outro apaixonado por essa profissão e que divulgou meu trabalho em seu digno espaço na Internet.

E aos colegas da Reuters, que confiaram nos meus esforços e me ajudaram nessa empreitada.

Não teria conseguido nada se não fosse por vocês.

Ainda é só o começo!

Rumo a Paris, para uma merecida semana de férias.

A bientôt!

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Olha só quem voltou a Pequim

Faltam só três dias para eu ir embora. E apenas agora, a quatro dias da abertura das Paraolimpíadas, vi mendigos andarem pela capital chinesa. Como toda sede de Olimpíadas, Pequim expulsou os seus pedintes semanas antes da abertura. Apesar das restrições para entrada na cidade e para ficar na rua esmolando, eles retornaram.

Também voltaram os jovens vestidos com roupas militares de camuflagem. Durante os Jogos só vi um deles, sempre o mesmo, perto do hotel ontem ficava o espaço do Comitê Olímpico Brasileiro em Pequim. Agora são montes.

Um amigo que vive aqui suspeita que eles sejam alguns dos tais paramilitares que fazem serviços pouco adequados para as tropas oficiais. Aqueles serviços que envolvem segurar a onda do pessoal de Taubaté (região cheia de monges budistas).

Faz sentido.

A ausência sentida nesses dias é a da poluição. Desde domingo dá para ver o horizonte sem nenhuma nuvem de nevoa nem de carvão --é movida a esse combustível que a China acelera sua economia em 10 por cento ao ano. Tudo bem, logo a poluição volta para se juntar à festa e encurtar o tempo de vida de quem vive por aqui.

Os picos de poluição de Pequim podem ser três vezes superiores aos picos de São Paulo, segundo dados oficiais. Três vezes mais.

Me faltam três dias aqui.

Estou me sentindo no fim de uma longa maratona. Mas estou tão desorientado que nem sei em que posição da prova eu estou.

Falta pouco, vamos lá.