quinta-feira, 5 de junho de 2008

Os Estados Unidos de Barack Obama


Não falta intelectual dizendo que o Brasil tem uma sociedade moderna, que tolera bastante bem as diferenças étnicas, religiosas e de gênero. Eu discordo. Afinal das contas, enquanto nós ainda discutimos as ações afirmativas e exaltamos o recente crescimento econômico do Nordeste quase com comiseração, os Estados Unidos podem eleger um negão para presidente. Enquanto damos afagos retóricos, os americanos mostram políticas concretas e dão poder a quem não o teve por décadas. Muito respeitável.

Em seu discurso sobre raça, no qual rebateu os argumentos do controverso reverendo Jeremiah Wright, pastor que o acompanhou a vida toda na Igreja, Obama mostrou que a sociedade americana não pode ser condenada hoje pelo fato de ter empurrado negros para a parte de trás dos ônibus há mais de meio século. Ela andou para a frente. Elegeu representantes descendentes de indianos, muçulmanos, latinos, negros e até um austríaco rombudo.

E nesse meio tempo, o que fez o Brasil?

Em um país composto amplamente por negros e pardos, quantos deles nós temos no topo de grandes empresas? No comando do Executivo, seja em que nível for? Quase nada.

Apesar de o quadro ter sido atenuado nos últimos anos, o Brasil é um país ainda fraturado e racista. Basta ir a um prédio dos Jardins de São Paulo ou a algum condomínio da Barra da Tijuca e perguntar a um porteiro qualquer se ainda não ouviu um dos endinheirados moradores condená-lo por ter votado no presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Um presidente que é o limite do que o Brasil conseguiu nesse sentido, sendo ele um ex-pobre torneiro mecânico do Nordeste. Mas que há décadas se aburguesou, muito antes de chegar ao Palácio do Planalto. Um burguês sindical, digamos.

Comparado à simbologia de Obama, Lula parece nitidamente menor. Obama não foi torneiro mecânico; saiu da pobreza e virou professor universitário. Lula impôs sua vontade ao partido, que o considerava inevitável, acima do bem e do mal. Obama foi às bases, trouxe jovens para o processo eleitoral e mudou o partido no voto. Lula tem visão centrada no Brasil. Obama, que viveu na Indonésia, no mundo.

São estaturas diferentes. E enquanto a vitória de Lula não parece ter aberto muitas portas para políticos vindos da classe popular, a nomeação de Obama como candidato democrata tem impacto até sobre o Partido Republicano, que cogita vários representantes de minorias étnicas para disputar a Vice-Presidência.

Essa diferença entre os dois políticos cabe também para as duas sociedades. Quando dizem que a sociedade americana é doente, fico me perguntando o que pensar da brasileira.

Ainda não tenho resposta.

A candidatura de Obama mostra que o resto do mundo democrático precisa se modernizar e delegar poderes reais aos antes excluídos. O morro desceu e agora tem chance de conquistar a cadeira mais importante do mundo. E mesmo que o negão não vença, os EUA não serão um país mais racista em janeiro de 2009 do que o são hoje.

É o resto do mundo que hoje se vê muito atrás da democracia americana. Porque apesar de George W.Bush nos ter feito esquecer disso, nesse assunto eles ainda estão muito à frente de todos.

3 comentários:

Anônimo disse...

Texto intocável, cara. Daqueles que dá mesmo gosto de ler.

Um dia a gente chega lá... Será?

sabrina duran disse...

oi,

gostei do seu texto. mto bem escrito. achei seu blog pelo blog da cris figueiredo. acho que nos cruzamos algumas vezes pela casper. me formei em jo tb, em 2002

abraço.

sabrina duran

LLCeR aka Salazar disse...

Por mim, Obama pode vir a ser uma boa. Votaria nele, desde que ele não virasse um "Obama Bin Laden" no futuro. Ele tem um belo sorriso. Veremos se combina com todo o resto do pacote.