quarta-feira, 22 de abril de 2009

Finalmente alguém enquadrou Gilmar Mendes

Não deixa de ser divertido de ver alguns pudicos criticarem o ministro Joaquim Barbosa por ter confrontado o colega Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal. Um afirma que o clima na mais alta corte do país foi comparável ao de um boteco qualquer. Outro, que tem problema na cabeça e que se derreteu ao heroismo de Barbosa na investigação do mensalão, agora não aceita sequer comentários elogiosos ao ébano jurídico.

Tudo porque o negão mais importante do Brasil disse o que muita gente gostaria de dizer ao advogado geral da União do governo Fernando Henrique Cardoso. Quem é que gosta de ver as fontes acossadas de forma tão formidável, não é verdade?

Lembro que nos idos de 2002 o presidente do STF era Marco Aurélio de Mello (que figura lamentável), mais conhecido como primo do ex-presidente Fernando Collor. Afeito a dizer bobagens com o famoso timbre de quem tem um ovo na boca, o rapaz gostava de falar aos jornalistas e aparecer na televisão, inclusive antecipando julgamentos - algo que não coaduna, como ele diria, com a função que exerce. Qualquer semelhança com o ministro Gilmar Mendes, que viaja o mundo a falar mal da Constituição brasileira e trabalha no principal tribunal constitucional do país, não é mera semelhança.

Uma diferença fundamental (se minha memória não falha) foi a de que Mello teve a atenção chamada por seus colegas de corte. Em particular, sem a animosidade que vimos nesta quarta-feira, mas ganhou um pito por falar demais. Passou a comportar-se um tanto melhor. Mas será que alguém alertou ao ministro Mendes desde que ele chegou à presidência da Casa que ele deveria poupar o tribunal das suas opiniões antes de julgamentos importantes?

Será que algum colega sugeriu a que Mendes que ele andava aparecendo demais nos jornais, utilizando o STF como trampolim de político oposicionista? Será que Mendes não sofreu nenhuma pressão depois de tomar suas decisões controversas para libertar o banqueiro Daniel Dantas? Parece que nada disso aconteceu. E, talvez por isso, Mendes se sinta à vontade para dizer que quem não concorda com ele, como Barbosa, faz "impopulismo judicial".

E o que ele faz tem que nome?

Talvez o ministro Barbosa não precisasse ser tão afiado nas críticas a Mendes em público. Em especial quando fala sobre "capangas" em Mato Grosso, sugerindo que o presidente do STF é um gângster. Mas o fato é que absolutamente ninguém tinha feito uma crítica decente até agora apesar das ridículas demonstrações de Mendes há meses de que está mais preocupado com política do que com a Corte.

Pelo menos por um tempo, ah, que alívio, que o tio Gilmar Mendes vai sossegar o facho. Só por isso, já devemos agradecer ao ministro Barbosa pela performance que relaciono abaixo. Ao menos por uns tempos o presidente do STF vai fazer o que se espera dele: opiniões apenas nos autos. E sem fazer bico.



Em tempo: após a publicação deste texto os ministros do STF, exceto por Barbosa e Ellen Gracie (em viagem), dizem em nota que "reafirmam a confiança e o respeito ao Senhor Ministro Gilmar Mendes na sua atuação institucional como Presidente do Supremo, lamentando o episódio ocorrido nesta data".

O Globo diz que Mendes pressionou por um texto que condenasse a intervenção de Barbosa contra ele. Não conseguiu. Ganhou apenas essa tíbia nota, em escassas linhas, que não o tira da desmoralização pública em que entrou. As palavras são tão contidas que acabam dando razão final ao ministro Barbosa. Vejamos as reações nos próximos dias para saber se os amigos de Mendes na mídia vão se mexer.

3 comentários:

Fábio disse...

Rapaz, o começo do seu texto me assustou: espero que "o problema na cabeça" do Reinaldão, de que você falou, não seja o tumor no cérebro que ele felizmente conseguiu vencer. Não quero crer que um cara inteligente como você, grande jornalista, talentosíssimo, faria essa brincadeira de mau gosto com um assunto tão delicado. Tripudiar com problema de saúde dos outros não é coisa que se faça, né? Enfim. Acho que deve ter sido só impressão minha. Sigamos.

Concordo contigo quando diz que Gilmar Mendes merecia, vá lá, ser "enquadrado". A questão é a maneira como foi feito esse tal "enquadramento": publicamente, com ofensas típicas de boteco sim, em plena sessão plenária da mais importante Corte do país. E, goste-se ou não de Gilmar, o fato é que ele é presidente do Supremo Tribunal Federal - e não merece, nem ele nem ninguém, ser achincalhado publicamente dessa forma. Joaquim Barbosa perdeu a razão ali. Mandou mal, muito mal.

Quer lavar a roupa suja ou dizer que o presidente do STF anda aparecendo demais na mídia? Ok, mas não assim. Não há nada que justifique o "piti" de Barbosa.

O episódio apenas confirma que o estágio de degradação das instituições brasileiras é avançado. Judiciário, Executivo e Legislativo estão capengando cada vez mais. E isso dá um medo...

M.S. disse...

Fábio, problema na cabeça ele tem desde que trabalhava na Folha, a doença que ele teve não afetou o juízo do rapaz mais do que estava afetado. Não acho que o bate boca tenha sido tão inédito ao ponto de inviabilizar o trabalho das excelências do STF. Barbosa não inaugurou a era do confronto na Corte e, embora um pouco acima do tom, fez uma crítica pertinente que ninguém tinha feito diante de Gilmar Mendes: juiz fala nos autos. O mesmo valeu para vários outros presidentes do STF (função, aliás, que não dá a ele nenhum poder especial). Por que Mendes pode falar como se ele fosse o Supremo? Não pode, não. Tem de saber se comportar. E ele não tem mostrado que sabe há tempos, independentemente do Daniel Dantas.

Abraço

Fábio disse...

"Um pouco acima do tom" é bondade sua, não? Joaquim Barbosa extrapolou todos os limites do bom senso! Para mim, perdeu a razão ali.

Mas concordo que Gilmar Mendes precisava mesmo de um chacoalhão. Como você bem disse, é bem provável que agora ele se contenha um pouco mais antes de dar seus pitacos por aí. A ver.